GROTESCO: diz-se de ou categoria estética cuja temática ou cujas imagens privilegiam o disforme, o ridículo, o extravagante etc.
que ou o que se presta ao riso ou à repulsa por seu aspecto inverossímil, bizarro, estapafúrdio ou caricato.
é curioso como um corpo pode causar tantas reações. no meu caso, vejam, o peito cai sobre a barriga, a barriga cai sobre o púbis, o umbigo é "triste", há estrias, muitas. excesso de gordura, celulite, flacidez, varizes, manchas e cicatrizes. é um corpo, é meu corpo, com o qual já briguei por muito tempo, do qual já tive raiva. eu tinha raiva de mim mesma por me olhar no espelho e não reconhecer em mim um padrão que eu via por toda a parte, mas que não era eu. no fim das contas, percebi que eu não sou o meu corpo, sou TAMBÉM o meu corpo, mas não só ele.
"meu" corpo, parece que a gente fala de um objeto, né? "o corpo dela". não parece que falamos de uma pessoa, parece que nos referimos a uma coisa, mas é bom lembrar que esse corpo só tem valor quando está vivo, quando tem uma energia vital que o faz funcionar e é, então, que podemos nos ver para além de um corpo. somos todos corpinhos no mundo, andando por aí; o corpo nos leva a passear, mas ele só faz isso porque estamos vivos, então, somos mais do que o corpo. tanto é, que é só morrermos para quererem se livrar do "corpo" que, por si só, não quer dizer muita coisa. quando alguém morre, a gente se lembra de como a pessoa "era", cabendo nesse "ser" um corpo e tudo o mais que a gente não consegue enxergar nele.
o corpo personifica a gente, junta tudo o que somos dentro de um amontoado de carne. ninguém pode ver você por dentro, mas podem ver o nosso corpo e daí há pessoas que confundem tudo; acham que ver o corpo é saber quem somos, e não é. claro, o corpo dá pistas da gente, assim como as nossas roupas falam um pouco do nosso "estilo", mas olha, o estilo se refletir na roupa é só uma das suas nuances, como o corpo é só um pouco do que a gente é por dentro. os ditados mais clichês são os mais verdadeiros: "a verdadeira beleza vem de dentro" é real porque a beleza física é só um ponto e tudo o que é material tende a definhar com o tempo. quando a gente permite que o corpo nos defina e não somos capazes de enxergar a nossa subjetividade, a tendência é que nos odiemos e definhemos por dentro também, mas por dentro a gente não engorda, nem emagrece. por dentro, a forma não importa coisa nenhuma.
vou simplificar: pensa num fusquinha e numa ferrari. por fora eles são bem diferentes, é verdade, mas se não tiver ninguém que os dirija, eles vão ficar parados pra sempre, não servem pra nada. sendo bonitos ou feios, sendo um super carro ou um carrinho popular. o que importa é quem conduz o carro, quem vai dentro dele, sabe?
queria publicar essa foto há algum tempo, mas queria elaborar o porquê de estar fazendo isso. primeiro e determinado pela forma e pelo MEU conceito de beleza, acho que estou espetacular nela. linda, maravilhosa, fantástica e, de verdade. podem pensar: "ah, mas ela está se expondo". sim e não. estou expondo o meu corpo, não quem eu sou. "ah, ela quer chamar atenção!". sim, eu quero. quero mostrar que um corpo é só um corpo e eu não tenho nenhuma vergonha do meu, mesmo que ele esteja longe de um padrão estético, é assim que ele é, ué... poderia ser mais "bonito"? poderia, mas está desse jeito no momento. "nossa, mas é ridícula, gorda, feia, boba e cabeça-de-melão", o que você pensa a meu respeito é um problema só seu e você vai continuar pensando, eu estando pelada ou vestida. "caramba, que corajosa!", corajosa por quê? me exponho muito mais nas palavras que posto aqui de vez em quando do que nua, então... minhas palavras mostram muito mais quem sou eu do que a minha forma física.
a gente se expõe todos os dias, quando fala, quando se manifesta e quando cala também. às vezes, as grandes exposições vêm no silêncio, quando a gente deveria de fato dizer alguma coisa. tô aqui usando meu corpo e minha escrita pra dizer que meu corpo não sou eu, que você não faz ideia de quem eu sou só porque me viu pelada. e não me sinto vulnerável por estar sem roupa, por mostrar meus "defeitos", primeiro porque eu me vejo perfeita; segundo porque quem quer julgar vai fazer isso não importa como você esteja. se você se sente plena e maravilhosa ou "o cocô do cavalo do bandido", não faz diferença; quem quiser dar palpite na sua vida, no seu corpo, vai vir com seu caminhãozinho de merda e vai estacionar na sua frente e começar a descarregar toda a frustração dela em cima de você, do seu corpinho feliz e satisfeito. eu, hein!
eu postei essa foto porque queria compartilhar com quem quiser ver que essa sou eu, fisicamente apenas, e eu não tenho qualquer razão para me sentir embaraçada de me mostrar porque eu me curto. eu me gosto. todos os dias? obviamente que não. há dias e dias e tá tudo certo! a única regra da vida é a instabilidade/ a impermanência, então eu não teria como me amar o tempo todo, mas no geral, oh, eu me amo! eu não publiquei essa foto buscando validação, porque como vocês podem ver, eu faço isso por mim mesma e é só a minha aprovação que importa pra mim.
estou preparadíssima para ser julgada, achincalhada - porque parece que as pessoas se ofendem com o que não acham "bonito", mas é aquele ditado milenar: "ema, ema, ema, cada um com seus problemas". eu não tenho um problema com o MEU corpo, então, se você, que não sou eu, tem um problema com o meu corpo, você realmente tem problemas; busque ajuda. eu não quero "biscoito" e acho essa expressão horrível, porque não sou um cachorro treinado que ganha biscoitos quando faz um truque legal pro seu dono.
essa foto não tem nenhum intuito sexual, mas se você é o tipo de homem asqueroso que acha que se uma mulher posta uma foto é pra VOCÊ, vá tomar diretamente no olho do seu cu. se eu receber algum tipo de comentário nojento ou desrespeitoso, você será exposto. se você, que é homem, leu tudo o que escrevi e ainda assim insistir em se comportar como um neandertal, saiba que você tem sérios problemas cognitivos; busque ajuda.
no geral, temos muito mais empatia pelos outros do que por nós mesmos. a gente se maltrata, se maldiz, mas consegue olhar pro outro com compaixão - isso quando conhecemos e gostamos da pessoa; quando não conhecemos ou não gostamos da pessoa, a gente acha que tem o direito e a propriedade pra falar dela. é importante que tenhamos uma atitude mais amorosa diante de nós mesmos. nosso corpo não é imperfeito ou defeituoso porque a gente não se parece com alguém que faz parte do padrão estabelecido, mas de mentira. a gente é como é, e é passível de mudar sempre que quiser, se quiser, quando quiser.
considerando que somos todos singulares por dentro - com todas as nossas vivências, modos, costumes, maneiras de pensar e de agir -, se a nossa subjetividade é única, por que é que deveríamos nos parecer com alguém que não é a gente? por que é que não podemos parecer com nós mesmos sem nos sentirmos errados/feios? por que é que nos importamos tanto com o que pensam/acham/dizem de nós? por que é que nos maltratamos para caber, sendo que já estamos dentro do nosso corpo e cabemos nele perfeitamente? bom, tenho certeza de que não há uma resposta só pra isso, nem que haja uma resposta certa.
as respostas são muitas e estão por toda a parte, em todos os lados para os quais olhamos, porque a resposta está no culto às coisas, à aparência; na insistência do sistema em nos reificar e nos tornar insatisfeitos, infelizes e bons consumidores... dá canseira só de começar a falar, mas o caminho é provocar pra refletir. e é isso aí. a gente pode pensar a respeito. a gente pode olhar pra um corpo e fazer o exercício consciente de pensar que é só um corpo, que todos temos uma forma - fisicamente falando - de estar no mundo e, se uma pessoa escolhe ser ou é de determinado jeito, isso não tem nada a ver com você. não é pra você, não é sobre você.
no caso, aqui, é sobre como eu aprendi a me amar - e isso não quer dizer que vou gostar do meu corpo todas as vezes em que o vejo refletido no espelho, a coisa não funciona de maneira permanente, NADA funciona de maneira estanque e definitiva -, é sobre colocar as coisas em perspectiva, não ter vergonha de ser/estar como se é/está, mas também não é sobre ter coragem. é sobre ser ridículo, sabe? anormal, grotesco... é sobre estar aqui agora, neste exato momento, e me achar uma pessoa incrível, por dentro, por fora, virada do avesso e é muito bom se sentir assim, liberta do crivo alheio... não pra sempre, mas hoje estou livre.
P.s.: sim, eu tenho pelos, como todas as pessoas adultas têm. caso você não goste dos seus, você pode dar a eles o fim que quiser. Eu gosto dos meus pelos. Acho que eles me deixam bonita e ponto.