sexta-feira, 16 de outubro de 2020

sobre sonhos com camas e as camas sobre as quais sonhamos


Em um sonho da manhã, que já fora atropelado pelos despertadores barulhentos, estou eu em uma casa nova. era um palacete, um enorme palacete antigo. os corredores largos tinham um pé-direito altíssimo cujo teto era todo feito de vitrais ou pinturas muito coloridas, agora não sei dizer ao certo. era lindo; só olhar para o teto já era um gozo em si. o assoalho era todo de madeira, de tábuas muito compridas e já meio carcomidas pelo tempo. andava sobre ele e sentia o ranger da casa falando comigo. nos longos corredores havia portas igualmente grandes que davam para muitos quartos, mas também para a casa de outras pessoas, onde eu queria entrar para ver o quão diferentes suas casas eram da minha, sendo que tudo ocupava o mesmo palacete. nos quartos que me cabiam, eu entrava e a Ana já os havia arrumado; em todos eles havia muitas camas; duas camas de casal e mais uma de solteiro; três camas de solteiro, camas, camas, camas, eram camas demais! ocupavam o espaço de maneira desmedida; éramos só nós duas, não precisávamos de tantas camas, mas todas pareciam muito confortáveis. penso agora, egocentricamente, que a minha cama é a mais confortável em que já dormi; penso em todos os anos deitada sobre ela para que fosse devidamente amaciada; penso em todos que nela já se deitaram, nas marcas que deixaram sobre ela. penso, então, que uma cama é tão íntima quanto nossos relacionamentos. penso nas camas em que já me deitei, nas pessoas com quem já dormi, com quem já compartilhei a mínima distância de cabeças, em que meus sonhos se faziam no travesseiro e os do outro, ao meu lado, se faziam igualmente em sua cabeça. deitados na materialidade, mergulhamos no inconsciente dos sonhos e, de manhã, partilhamos a experiência solitária do nosso descanso.

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