segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Carta de suicídio

A quem interessas possa, isto aqui é uma carta de suicídio.

Sempre que escrevo um texto, escrevo e por último coloco o título, mas este já tem o título de cara porque a decisão foi pensada com cautela, como deve ser quando você pretende dar fim a um sofrimento.

Devemos pesar sempre os prós e os contras da nossa vida, ver e rever conceitos, crenças e atitudes; foi o que fiz, na verdade venho fazendo há algum tempo já. E esta decisão que cabe somente a mim deverá me livrar do sentimento de angústia e tristeza que esta vida me causa. A gente se vicia na vida que leva e quando para para pensar, para vê-la de perto, não mais como um espectador, você, então, se dá conta de que não importa quantos anos você tenha, especialmente nesta vida, você ainda age como se fosse o umbigo do mundo. Você quer ser importante, todos querem. Você quer atenção, amor, afeto, afeição, carinho. Você quer milhares de coisas boas, mas quando você percebe que o seu vizinho quer o mesmo que você, então começa uma pequena e velada guerra de egos, de inveja pela conquista alheia, pela felicidade estática do outro, pelas viagens que os outros fazem, pelo reconhecimento que têm e que esfregam na sua cara 24/7. É triste admitir que somos todos diferentes, que nossos gostos não são cem por cento iguais, que nossas crenças se esbarram, que nossas ideologias diferem, que nosso orgulho é ferido e que o centro do mundo não somos nós; até somos, mas cada um é o seu.

É difícil de acreditar que todo mundo tem problemas e que cada um sabe exatamente onde dói o seu calo, onde o peso pesa mais nas suas costas, a despeito de toda a felicidade, autoajuda, autocomiseração, e mais um monte de coisas. Somos condescendentes demais com a gente, aceitando vidas de merda cercadas de pessoas que estão cagando e andando para gente, por mais próximas que elas pareçam. Cada um quer brilhar no seu quadradinho, mesmo que seja às custas de alguém, mesmo que seja de mentira, mesmo que quando você se desconecte da porra da rede a sua vida seja uma bela miséria.

Eu nasci aqui no dia 10 de abril de 2009, e o nascimento foi tímido porque não entendia como esse mundo funcionava e ele me parecia muito complicado e pouco útil. Quando larguei a outra vida para entrar nesta que parecia ser a vida em que todos estavam encarnando, eu não fazia ideia de que ela me tomaria tão inteiramente. No começo, não interagia; só via a vida alheia se desenvolvendo através dos meus "amigos", mas logo comecei a atuar também, como todo mundo.

Eram fotos postadas - vejam como sou jovem, feliz e boa fotógrafa! -, músicas postadas - vejam o meu gosto musical e como expresso meus sentimentos através de clipes -, frases postadas - vejam como tenho opinião para tudo -, textos, fotos, frases compartilhadas - vejam quem eu sou por meio de fotos, textos e frases que não são meus, mas que expressam toda a profundidade do meu ser e a indignação que tenho perante este mundo cruel -, páginas curtidas - vejam como sou cool e descolada e sigo quem é cool, engraçado, irônico e descolado na medida que me interessa e assim foi.

Fora os "amigos". Nem tenho muitos, mas eles são colecionados baseados em critérios muito rigorosos: conheço pessoalmente; parentes de 1° a 6° grau, incluindo os de vizinhos distantes; foram meus amigos no jardim de infância; estudei com eles no ensino fundamental/médio/superior, incluindo os fdp que nem gostavam de mim; trabalhei com eles no emprego de bosta que tive; dormi com eles, arghhh; vi uma vez em uma festa de relance, mas quis adicionar... É, talvez não sejam tão rigorosos assim, mas eu tinha que adicioná-los porque empilhar gente é poder nessa vida. São contatos, pessoas que fazem volume no espaço infinito da rede.

Dessa gente toda, se tenho contato frequente com vinte delas, é um número bem razoável... As outras todas servem para eu ver que vivemos todos em uma grande mentira cibernética que consome, entedia e vicia tristemente. Hoje, posso dizer com pesar enorme que sou viciada no Facebook e que isso não me traz quase nada de bom. Fiquei viciada em querer saber da vida dos outros, sem que isso represente qualquer benefício para a minha própria.

Talvez haja pessoas que façam bom uso da ferramenta e é bem provável que este não seja o meu caso. É claro que há coisas boas como reencontrar pessoas que não víamos há anos para que elas voltem a ser nossas "amigas" apesar de nunca se preocuparem em perguntar se você está bem ou vivo, mas elas estão ali na lista, porque amigos são para essas coisas! Há os "eventos" em que você pode ir, há as denúncias que você pode compartilhar, há as fotos fofinhas que você pode curtir, há as páginas que se encaixam perfeitamente ao seu estado de espírito e um monte de outras merdas legais. Mas enquanto eu vivo a vida de mentirinha que postam aqui o tempo todo, eu deixo de viver a minha própria lá fora, fora da linha.

O que me fez pensar mais tempo sobre morrer aqui ou não foi o fato de que eu poderia de alguma maneira divulgar o meu blog e para isso, o livro de rostos serve muito bem. Acontece que é mais fácil uma foto de um gatinho dormindo de barriga para cima ter mais curtidas e compartilhamentos do que o que eu escrevo, então não é uma grande vantagem para mim. Outra coisa que também me fez refletir foram justamente as imagens que eu vejo e que me despertam um enternecimento ou dor lancinante. Essas imagens me despertam emoções muito maiores do que as criaturas que passam o dia todo postando coisas estúpidas de autoajuda, autoaceitação e autocaralhoaquatro.

Mas agora, acho que já tomei minha decisão: as imagens que tanto me agradam serão salvas no meu computador para quando eu quiser vê-las e isso é sanado.

Quanto às pessoas, bom, aquelas que amo, respeito, tenho carinho, admiração e contato frequente, elas com certeza sabem que nada muda com a morte nessa esfera, pois o telefone, e-mail, e visitas ainda existem e estão aí para serem desfrutados. Àqueles por quem nutro carinho por terem feito parte da minha vida em alguma época dela, foi bom tê-los reencontrado, mas se não nos "falamos" via chat, curtidas e compartilhamentos, é provável que isso se dê porque hoje não temos mais nada em comum além do laço de amizade virtual que nos une e esse laço há que ser cortado porque não representa evolução na minha vida.

Agradeço a quem tiver lido isso aqui até o fim e será um grande sinal de consideração da sua parte.

Tenho quase certeza que menos de dez pessoas manifestar-se-ão a respeito, o que só comprova tudo o que já disse antes.

A quem fica, vida longa. Parto dessa para uma melhor e mais real, que é a minha vida. Não acredito mais em vida após a morte, mas ela, com certeza, existe após o Facebook.

Mais uma vez, a quem interessar possa, meu nome é Karla Cristina Fernandez Philipovsky Koerich, nasci em Florianópolis, tenho 28 anos, sou de leão e sou sua parente em algum grau, estudei com você em alguma série, fui ou ainda sou sua amiga próxima, dormi com você em algum momento escroto da minha adolescência, fui sua aluna em algum ponto da minha vida estudantil, vi você em alguma festa ou você é amigo de um amigo de um amigo, talvez eu nunca tenha visto você pessoalmente, mas achei que seria legal se fôssemos amigos, enfim...

Paz e luz a todos.


Um comentário:

  1. Sábias palavras,
    a vida alheia parece ser tão bonita vista de longe,mas é nos aproximarmos que percebemos que são poucas as diferencias entre a gente e o nosso vizinho.
    Comecei a acompanhar o seu blog depois que vi um vídeo seu no youtube,voltei ao passado e fui conferir,não achando vídeo algum percebi como somos vazios ao ponto de não conseguir lembrar de algo que me parece tão óbvio (mas em um mundo que o ter é mais importante que ser,isso não me surpreende)abraço,força e fel...

    "Só mais um Amigo"

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