(Aliás, mesmo não gostando do trabalho sem fim que demanda uma casa, é importante saber fazê-lo. Acho um absurdo gente que não sabe lavar um talher sem deixá-lo ensebado ou que não sabe fazer um feijão com arroz sem fazer drama de que não tem talento pra cozinhar. A gente aprende fazendo e isso serve pra mulheres e homens. "É de menino que se torce o pepino" já diria o ditado. Se você não aprende essas coisas quando pequeno, aos poucos, e a necessidade de fazê-las, é provável que você cresça sendo uma bela bosta. Não adianta ser bom na escola e não saber onde fica a vassoura; não adianta viajar pelo mundo e não saber lavar a porra da sua calcinha; não adianta ser lindo e sarado se você não sabe passar as suas roupas, mas enfim...)
Desse jeito eu aprendi, mas a minha mãe era bem esperta porque enquanto ela fazia coisas mais leves como estender a roupa, meu irmão e eu limpávamos a casa. Ela sempre foi boa em mandar, principalmente em mandar que os outros fizessem coisas que ela era perfeitamente capaz de fazer sozinha; isso me dava nos nervos.
Mas com ela também aprendi a cozinhar, depois de muito feijão e arroz queimados por esquecimento. Ela ia trabalhar, me deixava cuidando da comida que ficava no fogo, eu ia assistir a Xuxa e fodia tudo. Comida torrada, cheiro de comida torrada pela casa e me batia o desespero! A esculhambação ia me tomar inteira ao meio-dia; mas porra, eu tinha uns oito, nove anos... É muita responsabilidade pra uma fedelha uma panela de pressão! Enfim, hoje eu cozinho decentemente e quem já provou minha comida, sabe que ela é boa.
Mas voltando à arrumação... Eu achava que ela era neurótica porque podia estar tudo arrumado, mas se tivesse um copo na pia a tempestade estava feita: "Ninguém me ajuda, essa casa tá sempre uma zona!", e pensava eu que quando eu tivesse a minha casa as coisas seriam diferentes.
Pois então, hoje tenho a minha casa e também sou neurótica; as coisas são iguais. Mas é que, puta que pariu, essa porra de serviço não acaba nunca! Casas deveriam ser limpas e lacradas e deveríamos viver num quarto anexo que seria um chiqueiro.
Eu arrumo tudo, limpo tudo, tiro o pó, aspiro, passo o pano, lavo a louça, guardo a louça, levo o lixo pra fora, coloco a roupa pra lavar, estendo a roupa, recolho a roupa, dobro a roupa e a coloco no cesto pra passar, limpo a caixa de areia dos gatos, limpo privadas, pias, espelhos... Acontece que eu moro na minha casa e é isso que estraga tudo.
No mesmo dia aparece mais louça pra lavar e o chão já começa a ficar sujo de novo. É pelo de gato, meu cabelo que cai sem medida, os gatos que derrubam a tigela de água deles e fazem uma lambança diária na cozinha... É uma merda de trabalho ingrato... E tudo pra quê?
Se arrumo, tudo aparece de novo de qualquer jeito; se não arrumo, a cagada toda vai se acumulando de uma maneira que me deixa doida! Odeio arrumar a casa, mas adoro ter a casa arrumada. Às vezes baixa em mim o espírito da dona de casa perfeita e eu arrumo até as gavetas, jogo quilos de lixo fora, papelada de anos, arrumo o guarda-roupas; mas na maior parte do tempo, queria tacar fogo em tudo e sair correndo.