segunda-feira, 2 de junho de 2025

Sobre os ruídos de dentro

Ouço os ruídos que minha garganta produz, enxergo-os como fios de ondas de uma rádio mal sintonizada. Vejo esses fios na minha goela escura, na boca fechada, nos meus recônditos de carne cor de rosa. Me incomoda o som que fica entre meu cérebro e o resto de meu corpo. Entre mim que me escuto e o corpo que age à revelia da minha vontade. Me irrito com o sibilo. Acendo a luz, vejo a bombinha na mesa de cabeceira à minha esquerda, agito-a, tiro a sua tampa. Abro a boca e deixo que a luz entre por ela. O som que a bombinha faz entra pela mucosa e chega às ondas desalinhadas. Eu tiro a pequena bombinha de seu suporte. Vejo que está vencida há pouco mais de um mês; encaixo-a e chacoalho novamente, percebo que há ainda muito ar comprimido ali dentro. Não fora usada com frequência ultimamente. Isso é bom? Sugo mais uma dose. Prendo o ar. Conto lentamente até dez e, quando expiro, percebo que as linhas confusas se desfizeram. Penso nas primeiras frases do que escrevi aqui. Preciso escrevê-las só para ter certeza de que ainda consigo respirar, de que não me esqueci como é que se faz, mesmo quando parece que o corpo desaprende o que parece que sempre soube. 


01h26

Nenhum comentário:

Postar um comentário